quarta-feira, 26 de março de 2008

Razão pra rir

Se vocês me perguntarem por que eu rio com um texto, fica muito difícil responder. Lembro-me que, quando o Tom Jobim morreu, eu entrei em profunda depressão, até porque minha mulher se encontrava nos Estados Unidos e eu senti muita falta daquela fiel interlocutora de vida partilhada há tantos anos. Aí, minha filha Isabel, entrou e meu quarto e me estendeu um pequeno texto do Luis Fernando Veríssimo. E lá estava:

- Invadiram a Chechênia!

- De quem?

Eu passei a rir sem conseguir me controlar e essa piada simples salvou meu dia e quem sabe a minha vida. Em outro momento, eu passava mal na sala de espera de um consultório médico. Havia uma antiga Veja na mesa de centro. Abri num cartum do Millôr Fernandes em que dois cegos passavam diante de um incêndio, e um deles comentava:

- Esse deve ser o dia mais quente do ano.

São coisas assim, inesperadas, que viram o estado de espírito do leitor, subitamente, da depressão ao riso. Por isso, tornam-se indispensáveis.

Um texto que, não sei explicar a razão, me leva até hoje às gargalhadas é o que fala de um antigo atacante chileno, Ivan “Bam-Bam” Zamorano. Espero que vocês também curtam. Saiu, há um tempão, no Estado de São Paulo.


Zamorano assaltado no Leblon

Fernan “Bam-Bam” Zamorano, que se dizia primo afastado do grande artilheiro chileno, também era bom de mira: estava envolvido em vários negócios escusos, do tráfico de armas originário da Flórida à lavagem (muito, muito mais branca que a venda da Rolls Royce) excretada pelo banco dos Pintos, passando por parabólicas virtuais e chips contra ETs, cujo cliente era o Projétil Sivam. Barrigudinho, com um bigode meio mexicano de melodrama pré-Viagra e peruca regada a minoxidil, hasta que decidan regressar, Fernan, sem favor algum, parecia um sócio e um sósia, menos queimado, do arquivo P.C. Farias. Aguardava o jogo, distraído, com um sorriso falso. Gostaria de estar com a caliente Dolores, amante, secretária, fantasma e laranja ocasionais. A sogra de camisa do Chile recordava, pelo quepe e pelo estrabismo, um coronel torturador que conhecera em Valparaíso. Bam-Bam detestava esses arroubos de agressividade improdutiva. Poder era pra acumular - como a grana, claro - na encolha, na moita. Perdido entre las tinieblas de su soledad, procurava alcançar o gelo pra outra dose de consolo quando ouviu o alarido. Que coisa! Seria o fenômeno que os jornais brasileiros viviam descrevendo, mudernos compositores baianos?

A galera adentrou o carpete, no luxuoso apê do pretenso primo de Ivan Bam-Bam Zamorano, meia hora antes do juiz apitar o começo da partida. Todos de camisa do Brasssiiilll, bandanas, apitos, cornetas, sombreros, bandeiras... Abraçando Fernan Bam-Bam Zamorano, o que parecia líder da trupe disparou:

- Aí, gente: vamos cantar pros nossos anfitriões a melô da peleja, em cima daquela musiquinha da Globo!

E bola no filó:

- Ivan Bam-Bam / tem o jeito do Tchê! / Melhor Bam-Bam / que o senil Pinochet, / mas Ivan sem o calção, piu-piu... / Chileno é bimbinha. Brasssiiilll.

Apesar da brincadeira um tanto pesada, o dono da casa comoveu-se. Que turminha alegre! Trouxeram chapeuzinhos e adesivos pras crianças, além de um belíssimo buquê de crisântemos, ofertado a sua recatada esposa, dona Claridad. O cara com pinta de chefe subiu na mesa:

- Esse papo furado de rivalidade tem que acabar! Sejamos menos racionais e mais candomblé! Brasil e Chile são assim, ó, unha arrancada e carne pisada. Muita sujeira e covardia nas duas ditaduras. E nas Malvinas, nós torcemos por vocês, pô!

Bam-Bam tentou argumentar que as Malvinas, aliás Falklands, era assunto argentino.

- Esquece, malandro! Sul-americano é tudo o mesmo lumpen. Não foi com vocês mas poderia ter sido, é ou não é? E o papel da CIA, hein? Senora, que pasa? Fala alguma coisa, minha flor. Hii, rapaziada, ela tem o bumbum da Madona! Viva o bumbum do Bam-Bam! Cumé, cumé, cumé qui é?

Aplausos. Hurras. Uivos.

O dono da casa serviu-se de mais uma dose:

- Vocês são amigos de quem mesmo?

- Da onça. Brasssiiilll! De novo, com a musiquinha Globo, pessoal!

E ripa na chulipa, afinadíssimos:

- Eu sei que tô com a draga na mão, / tu abre o cofre ou vem o rabecão: / dólar, ouro, jóias e as ações. / Somos os Penta-Ladrões!

O pseudo-parente de Ivan Bam-Bam Zamorano, apesar de acostumado a uma briga de foice no escuro junto aos membros da Comissão de Orçamento, não resistiu ao assalto. Os foliões se mandaram, vieram os policiais. Também estavam uniformizados e um tanto de porre, só que mais confusos. Desatento aos rigorosos procedimentos da investigação - que lhe custaram um quadro, um isqueiro de ouro e peças íntimas de Dona Claridad - Fernan pensava em Dolores: o chefe da gangue, alto, barbudo, lembrava muito um ex-amante que Dolores encontrara no restaurante Antiquarius, depois de um mega-show no Metropolitan. Naquela noite, no motel Oásis, Dolores jurara, sobre seu peito, beijando os lindos dedinhos morenos em cruz, que era coisa sem importância, solamente una vez... Hipócrita, perdida, vadia, galinha, fê-da-pê.

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Depois de libertado das ligaduras verde-amarelas e da mordaça pintada com o perfil do Romário no corpo de um peixe, o porteiro do prédio, seu Zé, ex-candango, foi taxativo:

- Reconhecer, não reconheci ninguém, mas desde a construção de Brasília que eu não vejo ladrões tão animados!

Aldir Blanc


terça-feira, 4 de março de 2008

A TAL CAIXINHA DE SUPRESAS

Em terra de cego, leia-se Alfredo Sampaio, só deu Boa Vista.
Foi uma das mais injustas vitórias do futebol carioca. Só no primeiro tempo, o Boa Vista teve umas 12 (doze) finalizações a mais que o time do Vasco. Se jogar assim contra um grande, não interessa quantas caras feias o Sampa faça na “área técnica”, o Vasco vai ser goleado. E olha que, do meio pra frente, o Vasco tem as grandes promessas Alex Teixeira e Morais, além de Edmal, o Animundo, que pode ser maluco, mas é um atacante perigoso. Perguntar não ofende: pode desentupir os orelhões, antes de responder, ô técnico burro:
- O que fazem Amaral e Calixto no time titular do Vasco? Não pegam banco no Arapiraca.
Espantoso é também o comportamento da torcida: com o time tendo péssima atuação e o Boa Vista deitando e rolando, ninguém vaia, ninguém faz o merecido corinho de “burro! burro!” pro técnico. Estão quase todos conformados com a sucessão de vexames ou vivendo da lenda “o Vasco é o maior vencedor da Taça Rio”. Ora, antão loda-se!



FINAL DE CIRCO
Que se dane como e onde vai terminar a carreeeeiiira de Rolário, o Mercenário. O Flamengo, pra variar cascateando, diz que tem um projeto pronto para uma grande festa no Maracanã, onde o Padreco Baixinho fecharia a tampa, com a camisa do Fla, contra o Barcelona. Depois da festa, Ronaldinho Gaúcho, já que Ronaldo Fenômeno machucou-se, deve ser contrato por Kleber Danoninho, que dará como garantia o gás de Evo Morales. Já no Vasco, haveria um amistoso, em Januário (não tem santo lá) contra o Chelsea de Mossoró, o Baraúnas, adversário temível, seguida à comemoração de danças folclóricas com o grupo da Casa dos Poveiros. Seguir-se-á um Bacalhau à Jeurico, ou seja, estragado, e queima de puns com fósforos acesos no rego da bunda dos conselheiros e grandes gargalhadas, visto que se trata de um clube feliz pelas inúmeras conquistas recentes. Sei não, mas acho a festa do Vasco mais viado, perdão, viável.



O megartilheiro Souza, também conhecido como Souza, afirma que é a cara do Flamengo. Taí, concordo.
Enquanto acontecia esse estranho episódio do Vasco ganhar 4x0 sem merecer, o Flamengo sofria dois gols em vinte minutos do Resende, o Lyon das Agulhas Negras.
Já da pra sentir que vai ser um segundo turno infernal.



Falando em Calixto, o aguerrido lateral cruz-maltino declarou que bebia um copo de vodka antes de suas atuações na Rússia. A julgar pelo futebol apresentado, Calixto continua de porre até agora.



Dica de CD
Saiu o novo da CEJ – Companhia Estadual do Jazz, na qual meu amigo Reinaldo, do Casseta e Planeta (é, aquele mesmo) brilha no contrabaixo. Eu o estou destacando não em detrimento dos outros excelentes músicos, Sérgio Fayne no piano, Fernando Clark na guitarra, Guilherme Vianna no sax tenor e flauta e Chico Pessanha na bateria, além das participações especiais de Paulinho Trompete, Dom Chacal e outros ases. Destaquei o Reinaldo por dois motivos: porque ele e eu adorávamos o falecido Paulinho Albuquerque, que ia gostar demais do CD, e porque ser baixista vindo da carreira de humorista deve causar padecimentos parecidos com os meus, que não posso escrever crônica, conto, poema, sem tomar pela cara comentário do tipo “apesar de oriundo da música popular...”.
Pra aumentar minha alegria, está no CD minha única parceria com Moacir Santos, Jequié. Confiram. Os rapazes não estão brincando. É música pra valer, feito com esmero por gente competente e talentosa.



CENA CARIOCA
Com saudades do meu querido Lan: saco de gelo na cabeça, ressaca brutal, Mello Menezes vê com um olho só a bicha penteando a perua na tevê. Chega na rua a kombi do pão, a todo volume:
- ... temos a baguete de queijo, a baguete de alho, a baguete de orégano; temos o folheado de queijo, o folheado de lingüiça, o folheado árabe, o folheado de bacon; temos o pão francês tradicional e o mini; temos o rocambole de goiabada, o rocambole de creme, os rocamboles salgados de sardinha e de provolone; temos...
Desesperado, Mello sobe só de cueca no parapeito da janela e grita:
- Mentira! Não cabe essa merda toda aí dentro!